quinta-feira, 28 de julho de 2016

Medos Noturnos

Os minutos se arrastavam, lentamente. Meia-noite em ponto.
Dominado pela ansiedade, eu não conseguia desligar o cérebro e simplesmente pegar no sono. Meu pensamento agitava-se de medo e excitação, e podia-se ouvir o coração palpitar. Era impossível pregar o olho. O relógio do despertador marcava meia-noite e três minutos.
Deitado na escuridão do quarto, pensava no dia que estava por vir, no qual conheceria a nova escola. Novos colegas, professores, tudo diferente… eu era um garoto tímido, imaturo, e incapaz de enfrentar aquilo com naturalidade. O desconhecido me assustava.
Inspirei devagar, tentando ficar tranquilo. Era imprescindível que estivesse bem descansado. Mas o sono não chegava, e meu olhar se perdia nos detalhes talhados na madeira velha do roupeiro.
Examinei o despertador, novamente.
00:05.
De repente, o ar ficou frio. A noite tornou-se mais escura. A luz da lua que entrava pela janela pareceu enfraquecer. Um vento forte e barulhento sacudiu o pequeno quarto.
E então, silêncio.
Senti algo estranho, um sentimento ruim, que percorreu todo o meu ser, e tomou conta de minha consciência.
O que senti era uma presença. Algo de anormal estava acontecendo.
Um arrepio percorreu meu corpo…
Eu não estava sozinho.
Esqueci de tudo, de quem eu era, dos meus receios bobos da escola nova. O medo que invadia minha alma era agora mais profundo… eu tinha medo de morrer, e só queria que aquela noite acabasse.
“Mas que estupidez. Não há nada de errado, pare de ser criança.”
Mas esse pensamento não foi o suficiente. Meu ceticismo não era capaz de desfazer a sensação aterradora. Aquele medo era irracional, incontrolável. Dominou-me, por completo.
Escutei um rangido prolongado.
O despertador marcava 00:07. Foi a última coisa que vi, antes que a porta do roupeiro se abrisse devagar, e de seu interior emergisse um vulto, que vinha em minha direção.
Meu coração pareceu parar. Sem reação, paralisado de pavor, assisti àquela figura se aproximar de minha cama. A luz fraca da noite revelava uma velha horrenda, cuja face deformada ostentava um sorriso de dentes afiados como presas, e cuja pele cinzenta e disforme exalava um fedor pungente. A velha ergueu os dedos apodrecidos de unhas longas. Seus olhos vermelhos me fitavam, parecendo sondar minha alma. Ela chegou mais perto...
Aquela mão repulsiva e gelada tapou minha boca, abafando meus gritos, enquanto eu sentia as unhas afiadas da outra mão perfurando meu peito. Uma dor lancinante me subjugou.
Minha visão embaçou, tumultuada e caótica. E tudo se desfez.

De um sobressalto, pulei na cama, ofegante e aliviado. Havia sido apenas um pesadelo.
Respirei fundo, tentando me acalmar. Olhei para o despertador.
00:06.
Ouvi um rangido.

terça-feira, 12 de julho de 2016

Revolta

Revolta

Há uma sombra distante que se move
Há um vento pulsante à nossa volta
Há um pranto. Porém, não me comove
Mas gera, no incauto, uma revolta.

Ora, se desde o sêmen vítreo
Da Gênese primária universal
Existe a mácula profana do delírio
E o laivo do pecado original

Como há de, ainda, um ser vivente
Surpreender-se com o pesar latente
Fiel comparsa desde o nascimento?!

A vida é revolta, é fúria desmedida
É impelir contra a injustiça recebida
Um brado fraco, que se desfaz no vento.