terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Delírios Proféticos - Capítulo 3

A Donzela Pálida

A esfera de fumaça que envolvia a cidade impedia que ele pudesse observar as estrelas. Apenas a lua crescente era visível no céu negro. Postes e faróis de carros eram pequenas ilhas de luz no mar de escuridão. Um vento frio soprava, sussurrando entre o silêncio noturno. Paulo andava em direção ao parque, cujas árvores eram visíveis ao longe, iluminadas pela luz fraca dos lampiões. A cada passo que dava, seu coração parecia bater mais acelerado. Ele pressentia que algo sublime estava prestes a acontecer.
O parque permanecia na penumbra e silêncio. As crianças já tinham ido embora, mas suas risadas pareciam ainda ecoar naquele ambiente. Entretanto, o parque não estava totalmente vazio. Apenas uma figura era visível no escuro, iluminada pela luz fraca e alaranjada do lampião. Era uma mulher. Permanecia sentada no banco, imóvel como uma escultura de mármore branco, semi-oculta pelas sombras. Mas quando se levantou, esguia e elegante, pareceu emitir de si uma luz muito intensa.
Ah! Aquela luz, que a princípio queimou-lhe os olhos, por fim clareou sua mente, de modo sutil, e ele conseguiu enxergar a verdade das coisas. Aquela criatura, frágil e bela, mas humana, tornava-se algo divino diante dele, em uma apoteose deslumbrante e indescritível. Seu semblante resplandecia de pura beleza e bondade. No fundo de seus olhos negros, que pareciam um túnel sem fim, brilhava uma estrela incandescente, emitindo luz e energia. Seu rosto era delicado e harmonioso, um retrato da perfeição verdadeira e absoluta, sublime.... Paulo poderia olhar para ela a noite inteira, durante horas ou dias, até mesmo durante toda a eternidade, e assim, ser a pessoa mais feliz do mundo. Uma emoção muito forte tomava conta do seu corpo, deixando-o lívido e extasiado.
Ela parecia exalar um suave perfume, jamais sentido em pétalas de flores deste mundo. A palidez de sua pele contrastava com os cabelos, negros como o firmamento, que esvoaçavam como se uma eterna brisa os envolvesse. Perfeita em suas formas e contornos, delicada, assombrosamente linda, amedrontadora...
Paulo teve vontade de rir, de gritar, e em seguida, quase deixou escapar uma lágrima. Não de tristeza, nem de felicidade, ele não sabia ao certo o motivo. Mas tinha a certeza de estar presenciando algo misterioso e complexo, de estar observando a resposta viva de suas mais profundas indagações. Ele vislumbrou a face de Deus, assistiu à saga do Universo, de sua criação até o fim derradeiro, em um simples lampejo de olhar...
Enquanto ele a perscrutava, imóvel e fascinado, a garota parecia fazer o mesmo.
– Oi – disse ela finalmente, rompendo o silêncio. Sua voz sussurrante era uma melodia sutil e maviosa. Ao ver que ele continuava fitando-a, sem esboçar reação, acrescentou – Me chamo Clarice.

(...)

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