terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Delírios Proféticos - Capítulo 1

A Tortura Eterna


Uma luz muito intensa queimava seus olhos e ofuscava sua visão. O sol parecia arder próximo à sua córnea. Cego, ele tateou, buscando tapar a fonte luminosa. Subitamente, a luz se apagou, e ele se viu imerso num oceano interminável de escuridão. As pupilas doeram ao se dilatar bruscamente, procurando em vão a luz que se fora. Ele sentia um frio insuportável congelar seu corpo. Ficou amedrontado ao perceber que não era sua pele que o sentia, pois o frio vinha de seu interior. Suas entranhas se agitavam em alta velocidade, expelindo hormônios e adrenalina. Nesse momento ele percebeu que todo o seu corpo se movia na mesma direção, em alta velocidade, puxado por uma poderosa força gravitacional. Faltava-lhe algo sólido a que se sustentar, algo fundamental, a base das coisas, quando se está na realidade; não havia chão. Ele despencava de uma altura incomensurável, em direção ao solo, que devia estar nas profundezas daquela penumbra. Desesperado, tentou respirar, e ao sentir o ar lhe invadir os pulmões, percebeu que era frio, seco, desprovido de oxigênio, e não alimentava seu corpo. Tentou gritar, mas sua voz não saiu, e ele continuou despencando...
De repente estava sentado em um pequeno escritório.  Papéis impressos se amontoavam à sua frente. Ele tentou ler, mas sua mente não absorvia uma única palavra. Uma mulher se aproximou dele, e ao dobrar os lábios para falar, emitiu um estranho chiado robótico, agonizante, que parecia invadir seus ouvidos e rasgar seu cérebro. Atordoado, ele se levantou, e se afastou da mulher. Todos no recinto produziam aqueles sons bizarros, e se moviam de forma dura e mecânica. Eles não tinham íris ou pupila; os olhos brancos o fitavam ameaçadoramente. Afastou-se deles, e andou depressa até chegar no bebedouro. Tirou um copo de plástico, e acionou a torneira. Com um sobressalto, percebeu que não era água, e sim um líquido vermelho, que inundava o copo. Sentiu ânsia de vômito quando viu o sangue, quis fugir dali, correr para qualquer direção, mas percebeu que estava paralisado, e o esforço mental para controlar seus nervos somente lhe causava dores de cabeça. Assistiu o filete de sangue escorrer lentamente da torneira para o copo, e cada gota parecia demorar horas para finalmente cair. O sangue escorria também das paredes brancas. Os seres de voz robótica se aproximaram dele, e de suas bocas surgiam tentáculos viscosos e horripilantes. Eles acorrentaram-no e taparam sua visão. Ele foi arrastado bruscamente, e quando tiraram a venda, viu-se deitado em uma mesa de pedra fria, numa pequena sala  iluminada por velas. Um dos androides tinha nas mãos um ferro de marcar em brasa, e antes que ele pudesse gritar, sentiu seu peito pressionado pelo metal incandescente. A pele e os músculos queimaram, dissolvendo-se, e uma dor alucinante quase o enlouqueceu. Chacoalhou o corpo freneticamente, alucinado, mas uma pesada corrente prendia seus membros. Gritou em desespero, até a garganta doer, esperando que alguém o ouvisse e o socorresse. Parecia uma tortura insana o que estava sofrendo, entretanto, não via onde estava o torturador. Quem estaria controlando as máquinas? Perguntou-se o que teria feito para merecer aquela terrível punição. Teria morrido? Estaria Deus ou o diabo lhe condenando por seus pecados? E se aquilo era a morte, então o sofrimento se arrastaria por toda a eternidade?
Nessa hora, ele desejou que a morte fosse apenas o vazio etéreo da inexistência, como um sono profundo em que a consciência repousa, livre de todas as sensações, do medo da angústia, da dor...
Uma voz sussurrou palavras indefiníveis, como se soprasse instruções para sair daquela situação, encorajando-o a não se assustar. “Vazio”, “busca”, as palavras desconexas não faziam sentido, mas de alguma forma elas foram absorvidas por seu inconsciente. Ele desejou novamente o descanso eterno, e seu desejo foi atendido.
A tortura acabou, e ele mergulhou no mais profundo sono.

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